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Transferência e Contratransferência: O Legado Freudiano

Transferência e Contratransferência: O Legado Freudiano

1. Introdução

Na psicanálise, os conceitos de transferência e contratransferência são pilares centrais para a prática clínica e para a compreensão da complexa relação que se estabelece entre analista e analisando. A transferência, introduzida por Freud, refere-se ao processo em que o paciente projeta sentimentos, desejos e conflitos inconscientes, oriundos de suas primeiras relações, diretamente para o analista. Esse fenômeno não é simplesmente uma reprodução, mas uma expressão viva de conteúdos reprimidos que encontram, no espaço analítico, uma via para emergir e serem trabalhados. Por meio da transferência, o analista é convidado a ocupar o lugar simbólico de figuras significativas do passado do analisando, possibilitando que ele revisite experiências emocionais e conflitos que influenciam sua vida presente.

Por outro lado, a contratransferência representa as reações inconscientes do analista em resposta à transferência do paciente. Inicialmente vista por Freud como um obstáculo, a contratransferência evoluiu ao longo do tempo, passando a ser reconhecida como uma ferramenta clínica importante, que, se bem manejada, fornece reflexões profundas sobre o inconsciente do analisando e sobre o próprio analista. Este artigo visa explorar essas duas dimensões da relação analítica, desde suas formulações iniciais até os avanços mais contemporâneos. A partir de contribuições de teóricos que expandiram o legado freudiano, discutiremos o papel essencial desses fenômenos na prática clínica, assim como os desafios e as potencialidades que apresentam no contexto atual da psicanálise.

2. A Transferência na Psicanálise: Fundamentos e Conceitos

Origem e Contexto do Conceito de Transferência

Freud introduziu o conceito de transferência ao observar que os analisandos frequentemente direcionavam ao analista emoções e expectativas originalmente ligadas a figuras significativas de suas vidas, como pais e parceiros. Inicialmente, Freud viu esse fenômeno como um obstáculo, pois a intensidade dos sentimentos projetados pelo analisando — que podiam variar de afeto a hostilidade — parecia desviar o foco da análise. Contudo, com o aprofundamento de seus estudos, ele passou a entender a transferência não como uma barreira, mas como um recurso terapêutico essencial. Nessa repetição inconsciente de padrões relacionais, o analisando revive no consultório os conflitos reprimidos de sua vida emocional, agora deslocados para o analista, o que abre uma janela direta para os processos inconscientes.

Assim, a transferência possibilita ao analista acessar os desejos, medos e padrões emocionais ocultos do analisando, ajudando a desvendar os significados latentes de suas relações. Freud compreendeu que esse fenômeno permite a reencenação e, portanto, a interpretação dos conteúdos inconscientes, oferecendo uma base concreta para o trabalho analítico. Ao transferir afetos e expectativas para o analista, o analisando torna acessíveis os elementos reprimidos de sua história, o que possibilita ao analista desdobrar e interpretar conflitos psíquicos. A transferência, então, torna-se um fenômeno indispensável ao processo analítico, já que permite que o analisando experimente e confronte suas dinâmicas emocionais no ambiente seguro da análise, criando oportunidades para a transformação psíquica e a integração de conteúdos antes inconscientes.

A Transferência como Janela para o Inconsciente

Freud percebeu que a transferência não é apenas uma ocorrência inevitável no processo analítico, mas também uma ferramenta poderosa e essencial para o tratamento psicanalítico. Por meio da transferência, o analisando desloca para o analista sentimentos, desejos e conflitos originalmente vividos em relação a figuras importantes de sua vida, como pais, irmãos ou parceiros. Esse fenômeno cria um ambiente no qual o analista pode observar como os padrões inconscientes do analisando se manifestam em tempo real. Essa “reedição” de antigos conflitos no contexto da relação analítica permite ao analista acessar as camadas mais profundas do psiquismo do analisando, que se revelam através das emoções projetadas. A transferência, portanto, não só facilita o acesso a conteúdos reprimidos, mas também proporciona uma oportunidade de transformar esses conteúdos em elementos conscientes e integrados à personalidade do analisando.

Além disso, a transferência é um campo onde se pode trabalhar a repetição compulsiva de certos padrões emocionais e relacionais, com o potencial de romper com ciclos destrutivos e promover o crescimento psíquico. Quando o analista interpreta adequadamente as manifestações transferenciais, ele oferece ao analisando a possibilidade de compreender suas motivações inconscientes e de ver suas relações de um ângulo diferente. Esse processo de interpretação ajuda o analisando a ressignificar as experiências e a desenvolver novos modos de se relacionar com os outros e consigo mesmo. A transferência, por fim, é a chave para a resolução de conflitos inconscientes, pois permite que o analisando reconheça seus impulsos e desejos reprimidos, que antes operavam de modo dissimulado. Com o suporte da análise, o analisando pode integrar esses conteúdos reprimidos, promovendo um amadurecimento emocional e uma compreensão mais profunda de si mesmo.

Exemplos Clínicos de Transferência

Em situações clínicas, a transferência se manifesta quando sentimentos como amor, raiva, medo ou dependência são deslocados para o analista, replicando padrões relacionais estabelecidos pelo analisando em suas primeiras experiências de vida. Esse fenômeno pode ser observado, por exemplo, quando um analisando demonstra ciúmes ou desenvolve expectativas irreais de proximidade com o analista, como uma necessidade constante de validação ou aprovação. Essas reações não são apenas demonstrações isoladas de emoção; elas revelam traços importantes da dinâmica afetiva do analisando, especialmente questões não resolvidas de abandono ou carência afetiva, que remontam a relacionamentos passados com figuras parentais ou cuidadores significativos. Nesse sentido, a transferência atua como uma ponte entre os desejos inconscientes do analisando e suas experiências vividas, permitindo que ele traga para a análise conteúdos emocionais profundos que não conseguia acessar de outra forma.

Interpretar a transferência, no entanto, exige do analista uma postura sensível e equilibrada. Ele deve ser capaz de identificar e compreender essas manifestações emocionais sem ser levado a agir conforme os apelos do analisando. Ao mesmo tempo, o analista precisa resistir a responder de maneira pessoal, transformando esses sentimentos em oportunidades de análise e reflexão para o analisando. Através de uma escuta atenta e intervenções precisas, o analista pode ajudar o paciente a perceber que esses sentimentos são repetidos e deslocados na relação analítica, facilitando assim o reconhecimento de padrões inconscientes. Esse trabalho interpretativo permite que o paciente reflita sobre suas próprias reações e, gradativamente, encontre formas mais saudáveis de lidar com essas emoções fora do contexto analítico.

3. A Contratransferência: Do Rejeito à Aceitação

Contratransferência na Visão Freudiana

Freud considerava a contratransferência um elemento indesejado e até prejudicial no processo analítico. Para ele, as respostas emocionais do analista ao analisando poderiam facilmente comprometer a objetividade e a neutralidade da análise, que eram essenciais para manter uma interpretação precisa dos conteúdos inconscientes do paciente. A partir dessa perspectiva, Freud via a contratransferência como um reflexo das questões inconscientes não resolvidas do próprio analista, que interferiam no tratamento ao se misturarem com as projeções e os conteúdos do analisando. Assim, para Freud, a presença da contratransferência indicava um risco significativo de distorção da análise, pois dificultava a clareza e a precisão da interpretação necessária para que o analisando pudesse elaborar seus próprios conflitos.

Na visão freudiana, a contratransferência era, portanto, algo a ser evitado, pois ameaçava a própria eficácia do tratamento psicanalítico. Freud acreditava que as reações emocionais do analista poderiam obscurecer os significados ocultos das falas e comportamentos do analisando, ao desviar o foco para as questões pessoais do próprio analista. Esse aspecto da prática clínica era visto como um entrave à análise profunda e à revelação dos conteúdos inconscientes do analisando. Em resposta a essa possibilidade, Freud defendia que os analistas deveriam buscar resolver suas próprias questões internas por meio de uma análise pessoal aprofundada, para manter uma postura de neutralidade e distanciamento técnico, essenciais para o sucesso da abordagem psicanalítica.

Principais Contribuições dos Teóricos Posteriores

As contribuições de Melanie Klein, Donald Winnicott e Jacques Lacan ampliaram significativamente o entendimento da contratransferência e seu papel no processo analítico, cada um oferecendo uma perspectiva que enriquece a prática clínica. Melanie Klein, em particular, viu a contratransferência como um espelho das projeções inconscientes do analisando, o que permitia ao analista perceber diretamente os aspectos da vida psíquica do analisando. Para Klein, as emoções despertadas no analista não eram meras reações pessoais, mas respostas que revelavam as angústias, fantasias e mecanismos de defesa do analisando. Esse entendimento permitiu que o analista usasse a contratransferência como uma ferramenta para interpretar as projeções e identificações projetivas do analisando, transformando o que antes era considerado um obstáculo em uma via privilegiada de acesso ao inconsciente do analisando.

Donald Winnicott também trouxe uma visão inovadora sobre a contratransferência, destacando a importância de o analista estar em contato com suas próprias emoções para criar um “ambiente facilitador” que promovesse o crescimento psíquico do analisando. Para Winnicott, o analista não deveria buscar a neutralidade absoluta, mas sim uma autenticidade emocional que garantisse ao analisando uma experiência segura e genuína. Através de sua ideia de “holding” e da criação de um espaço potencial, Winnicott entendia que o analista poderia acolher e suportar as angústias do analisando sem se deixar dominar por elas. Já Jacques Lacan ofereceu uma abordagem diferente ao redefinir a transferência como um “Campo Simbólico”, no qual o foco se deslocava das emoções do analista para a estrutura do desejo do paciente. Em sua perspectiva, a contratransferência era menos sobre as respostas emocionais do analista e mais sobre o papel simbólico que ele ocupava para o analisando. Assim, Lacan via o fenômeno da transferência como uma forma de o analisando lidar com a falta e o desejo, onde o analista, em sua posição de “sujeito suposto saber”, se torna uma figura de intermediação simbólica que possibilita ao analisando reorganizar seus próprios significados e questões fundamentais.

4. Transferência e Contratransferência na Prática Clínica

Estratégias para Gerir a Transferência e Contratransferência

Para lidar com as complexidades de transferência e contratransferência, é crucial que o analista tenha um sólido autoconhecimento e se dedique à supervisão constante. A prática analítica exige que o analista desenvolva uma capacidade de auto-observação e uma sensibilidade para identificar suas próprias respostas emocionais, muitas vezes intensas, diante do analisando. Essas respostas podem ser indicadores valiosos sobre o estado psíquico do analisando e suas dinâmicas inconscientes, oferecendo uma perspectiva única sobre os sentimentos e conflitos que o analisando transfere para a relação analítica. No entanto, é importante que o analista consiga diferenciar suas emoções pessoais das projeções do analisando, evitando que suas próprias experiências emocionais interfiram no processo terapêutico.

Além disso, é essencial que o analista adote uma postura de neutralidade técnica, que não implica a ausência de sentimentos, mas sim um manejo cuidadoso e não-reativo de suas respostas emocionais. A neutralidade permite que o analista sustente o espaço analítico de forma acolhedora e segura, sem que suas próprias emoções dominem a cena. Manter essa postura técnica exige disciplina emocional e reflexão constante, uma vez que os fenômenos transferenciais podem despertar sentimentos poderosos e, às vezes, inesperados no analista. Para auxiliar nesse manejo, a supervisão clínica oferece um espaço para o analista examinar suas reações e obter orientação sobre como utilizar essas respostas emocionais de forma construtiva. Dessa maneira, o analista não só protege a integridade do processo terapêutico, como também transforma a contratransferência em um recurso para o avanço da análise.

Supervisão e Autoconhecimento

A supervisão clínica é um componente essencial na formação e prática contínua do psicanalista, pois oferece um espaço para a reflexão e o aprimoramento das habilidades analíticas. Ao compartilhar casos clínicos com um supervisor experiente, o analista tem a oportunidade de identificar padrões inconscientes em suas próprias reações e emoções durante a sessão. Esse processo de análise das respostas emocionais do analista é crucial para o manejo adequado da transferência e contratransferência, permitindo que ele se distancie de seus próprios impulsos e sentimentos. A supervisão também oferece um suporte fundamental em momentos de dúvida, ajudando o analista a encontrar interpretações mais precisas e evitando que suas respostas emocionais influenciem indevidamente o tratamento. Além disso, a supervisão cria um ambiente de segurança, onde o analista pode confrontar suas próprias limitações e desafios, aprimorando continuamente sua prática.

O autoconhecimento, por outro lado, é uma ferramenta indispensável para a prática psicanalítica eficaz. O analista precisa estar ciente de seus próprios processos emocionais, valores e crenças, pois qualquer inconsciente não reconhecido pode se refletir nas interações com o analisando, afetando a qualidade da análise. Quando o analista se conhece profundamente, ele pode distinguir entre as emoções geradas pela transferência do analisando e as suas próprias reações pessoais. Por exemplo, se o analista experimenta uma forte irritação com um analisando, o autoconhecimento permite que ele questione se esse sentimento é uma resposta genuína à dinâmica do analisando ou se é um reflexo de questões não resolvidas dentro dele mesmo. Esse discernimento é crucial para manter a neutralidade e a objetividade necessárias ao processo analítico, evitando que o analista se envolva excessivamente com o sofrimento ou as demandas do analisando, o que poderia comprometer o avanço do tratamento. Assim, tanto a supervisão quanto o autoconhecimento garantem que o analista não apenas compreenda as transferências e contratransferências, mas também as utilize de maneira construtiva para o processo terapêutico.

Exemplos de Transferência e Contratransferência na Clínica

No cenário clínico, a transferência e contratransferência se manifestam de diversas formas, refletindo a complexidade das relações entre o analisando e o analista. Um exemplo comum ocorre quando o analisando desenvolve uma relação de dependência com o analista, muitas vezes inconscientemente, projetando nele figuras parentais ou cuidadoras. Nesse caso, o analisando pode buscar o analista como uma fonte de segurança, admiração ou apoio excessivo, revivendo antigos padrões de apego. Por outro lado, o analista, ao perceber essas projeções, pode experimentar sentimentos de ser “necessário” ou “salvador”, o que evoca a sua própria necessidade de ser reconhecido como uma figura protetora. Isso coloca o analista diante da necessidade de lidar com sua própria contratransferência, discernindo essas reações emocionais do seu verdadeiro papel no processo terapêutico.

A contratransferência nesse tipo de situação pode se tornar um desafio, pois o analista deve ser capaz de distinguir as emoções que são originadas nas projeções do analisando das suas próprias respostas inconscientes. Caso o analista se identifique demais com o desejo de proteger o analisando, pode acabar se envolvendo de maneira excessiva, prejudicando a neutralidade necessária para o processo terapêutico. Por exemplo, o analista pode sentir uma forte vontade de oferecer conselhos ou intervenções protetoras, em vez de permitir que o analisando explore seus próprios sentimentos de vulnerabilidade. Nesse contexto, a supervisão clínica e o autoconhecimento se tornam ferramentas essenciais para que o analista compreenda suas reações emocionais e as utilize de forma construtiva, ao mesmo tempo em que mantém a distância emocional necessária para promover a reflexão do analisando sobre suas próprias projeções e questões inconscientes.

5. A Atualidade dos Conceitos: Reflexões e Desafios Contemporâneos

Transferência e Contratransferência no Atendimento Online

Com a expansão do atendimento online, novos desafios surgem para os psicanalistas, principalmente no que diz respeito à dinâmica da transferência e contratransferência. A virtualidade altera a presença física do analista, criando uma experiência de comunicação mediada por telas, o que pode modificar profundamente como os analisandos projetam suas emoções e vivenciam o processo analítico. Para alguns analisandos, a distância física do analista pode propiciar um ambiente de maior intimidade, permitindo que aspectos mais profundos de sua vida emocional e de suas relações inconscientes venham à tona mais facilmente. Isso ocorre porque a barreira proporcionada pela tela pode reduzir algumas defesas, permitindo que o analisando se sinta mais seguro para se abrir, como se estivesse compartilhando esses aspectos com uma figura mais distante ou neutra.

Por outro lado, outros analisandos podem vivenciar a falta de presença física como um fator de distanciamento emocional, o que pode impactar a transferência de maneira significativa. A ausência do contato visual direto e da presença corporal do analista pode levar o analisando a projetar sentimentos de abandono ou desconfiança, afetando a qualidade da relação analítica. Nesse contexto, o desafio para o analista é adaptar sua escuta e presença emocional para garantir que o campo transferencial, embora alterado, continue sendo mantido. O analista precisa ajustar suas próprias reações e maneiras de interagir, utilizando recursos como o tom de voz, o ritmo e a empatia digital para criar um espaço seguro e propício ao processo transferencial. O manejo dessas novas formas de transferência e contratransferência exige sensibilidade e flexibilidade, considerando que a modalidade online traz nuances únicas que exigem uma reflexão constante sobre os limites e as possibilidades da análise na era digital.

Desafios Culturais e Sociais Contemporâneos

Transferência e contratransferência também são profundamente influenciadas por fatores culturais e sociais, o que implica que a compreensão desses fenômenos não pode ser dissociada das realidades contextuais em que se inserem. Em sociedades multiculturais e globalizadas, as expectativas, valores e projeções dos analisandos podem ser fortemente moldadas por elementos como identidade étnica, religiosa e política, além de experiências de discriminação e marginalização. Traumas coletivos, como os relacionados à violência histórica, guerras, e movimentos migratórios, também deixam marcas significativas na psique dos indivíduos, que podem se manifestar no setting analítico. Isso exige que o psicanalista não só tenha uma escuta sensível e atenta às dinâmicas transferenciais, mas também um olhar crítico sobre suas próprias reações contratransferenciais, que podem ser contaminadas por preconceitos implícitos ou estereótipos culturais. O analista deve, assim, ser capaz de reconhecer as especificidades socioculturais que podem moldar a transferência e contratransferência, para não reduzir a interpretação psicanalítica a uma leitura unicamente individual, mas contextualizada.

O contexto contemporâneo, marcado por uma intensa globalização e uma crescente valorização do individualismo, também altera as formas como a transferência se manifesta na clínica. As novas formas de relacionamento, impulsionadas pela digitalização e pelo aumento das interações virtuais, transformam as dinâmicas transferenciais de maneira complexa, uma vez que o contato físico e a presença do analista são substituídos por uma mediação tecnológica. Esse fenômeno pode intensificar sentimentos de distanciamento ou aumentar a intimidade ilusória, dependendo da configuração da relação virtual. Além disso, o crescente individualismo pode acentuar o foco no eu e nas necessidades pessoais, muitas vezes criando um descompasso entre as expectativas do analisando e o papel do analista. Essas transformações requerem do psicanalista uma constante adaptação, que inclua uma reflexão crítica sobre como as mudanças sociais e culturais influenciam tanto a experiência subjetiva do analisando quanto suas próprias respostas emocionais durante o processo analítico. Assim, a compreensão da transferência e contratransferência no mundo contemporâneo exige um esforço contínuo de reconfiguração da escuta psicanalítica, levando em conta os desafios e complexidades dos tempos atuais.

Contribuições Recentes e Questões Éticas

Novas teorias e abordagens psicanalíticas continuam a explorar a complexidade dos fenômenos transferenciais, com uma ênfase crescente na interação dinâmica entre transferência, contratransferência e a ética da prática clínica. A partir da revisão das abordagens clássicas, teóricos contemporâneos têm ampliado a compreensão da contratransferência, não apenas como um obstáculo, mas como um recurso que pode enriquecer o processo analítico. Ao mesmo tempo, surgem novas questões sobre o uso da contratransferência como ferramenta ética, que demandam uma análise cuidadosa de como o analista lida com suas próprias reações emocionais e os limites de sua subjetividade. A consciência das respostas contratransferenciais, que podem ser tanto positivas quanto negativas, exige que o analista se posicione de maneira ética e responsável para que essas reações não sejam projetadas de forma prejudicial sobre o analisando.

As implicações de reações contratransferenciais intensas, como a idealização ou rejeição do analisando, podem ser profundamente disruptivas para a relação analítica e, portanto, devem ser constantemente monitoradas. No entanto, também se reconhece que a transparência e o autoquestionamento contínuo do analista são necessários para evitar que essas reações se transformem em mecanismos de defesa ou resistência. O respeito pela singularidade do analisando, por sua história e subjetividade, exige que o analista não apenas regule suas próprias reações emocionais, mas também mantenha uma postura ética e reflexiva durante o processo terapêutico. Nesse sentido, a psicanálise contemporânea tem enfatizado a importância do autoconhecimento e da supervisão clínica contínua para garantir que as reações transferenciais e contratransferenciais sejam tratadas com a devida ética, permitindo que se transformem em instrumentos de compreensão e cuidado, e não em barreiras para o progresso terapêutico.

6. Conclusão

Refletir sobre a importância de transferência e contratransferência é fundamental para o desenvolvimento contínuo do analista, pois esses fenômenos não apenas desvelam dinâmicas inconscientes no campo terapêutico, mas também oferecem uma oportunidade constante de autoconhecimento e aprimoramento profissional. A transferência, ao revelar desejos, conflitos e padrões reprimidos do analisando, e a contratransferência, ao fornecer ao analista uma chave para entender as reações emocionais e subjetivas que surgem no processo, são componentes essenciais para o sucesso terapêutico. A partir da compreensão e manejo adequado desses conceitos, o analista pode trabalhar de forma mais eficaz com o analisando, promovendo uma interpretação que favorece a compreensão dos mecanismos psíquicos e facilita o processo de cura.

Além disso, a constante pesquisa e discussão desses temas na psicanálise contribuem para o enriquecimento da prática clínica e para o desenvolvimento ético e emocional dos psicanalistas. O estudo da transferência e contratransferência é uma via de aprendizado contínuo, pois esses fenômenos exigem que o analista esteja sempre atento às próprias reações emocionais e ao contexto que se constrói com o analisando. Essa vigilância permite um exercício ético mais profundo, pois ajuda o analista a reconhecer e lidar com suas próprias projeções, garantindo que o processo analítico permaneça produtivo e respeitoso. Assim, o legado freudiano sobre esses conceitos não só sustenta o edifício da psicanálise, mas também proporciona uma ferramenta atemporal para o entendimento da complexidade humana, essencial para qualquer profissional da área.

Para abordar o tema “Transferência e Contratransferência é essencial referir-se aos principais textos de Freud que discutem esses conceitos centrais na psicanálise. Aqui estão algumas das obras mais relevantes:

1. “Dora: Fragmento da Análise de um Caso de Histeria” (1905)

– Freud introduz o conceito de transferência, descrevendo como a paciente Dora desloca para ele sentimentos inconscientes dirigidos a outras figuras de sua vida. Esta análise é uma das primeiras em que Freud reconhece a transferência como uma ferramenta na análise.

2. “A Dinâmica da Transferência” (1912)

– Neste trabalho, Freud examina a natureza inevitável da transferência no processo analítico, discutindo como a transferência permite que o paciente reviva conflitos passados e revele aspectos de seu inconsciente. É um texto central para entender o valor clínico da transferência.

3. “Conselhos ao Médico no Tratamento Psicanalítico” (1912)

– Freud discute o manejo técnico da transferência, orientando analistas a manterem uma posição de neutralidade e evitarem envolvimento pessoal com as emoções transferenciais do paciente.

4. “Observações sobre o Amor Transferencial” (1915)

– Freud trata do “amor transferencial,” no qual o paciente desenvolve sentimentos intensos pelo analista. Ele explora o fenômeno e a importância de se lidar com esses sentimentos de maneira analítica.

5. “Além do Princípio do Prazer” (1920)

– Embora este texto aborde diversos temas, Freud retoma a ideia de repetição, que também é central para o conceito de transferência. Ele sugere que os pacientes reencenam experiências traumáticas como uma forma de repetição compulsiva no setting analítico.

6. “O Início do Tratamento” (1913)

– Este texto contém observações sobre o desenvolvimento da transferência e orientações sobre o início do processo analítico, incluindo as reações emocionais que emergem no início da análise.

7. “Psicologia das Massas e Análise do Eu” (1921)

– Embora o foco seja a dinâmica de grupo, Freud faz comparações úteis entre a relação do líder com os membros de um grupo e o fenômeno da transferência na relação paciente-analista, aprofundando a ideia de projeções inconscientes.

8. “Análise Terminável e Interminável” (1937)

– Neste ensaio, Freud revisita a transferência e a contratransferência, questionando os limites da análise e a complexidade dos fenômenos transferenciais e contratransferenciais no processo terapêutico.

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