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Um pouco da história da Histeria e sua Contribuição para o Surgimento da Psicanálise

Um pouco da história da Histeria e sua Contribuição para o Surgimento da Psicanálise

O que é Histeria na Psicanálise:

É importante compreender como surgiu o termo histeria e como a histeria tem um papel fundamental no surgimento da psicanálise. A histeria era considerada nos primórdios uma condição médica em que os sintomas físicos não apresentavam causa orgânica aparente. Dentre as maninfestações histéricas ocorriam sintomas como: paralisias, convulsões, amnésias e de forma geral comportamentos emocionais considerados extremos. O problema relacionada à histeria era considerado um problema que assolava em maior parte as mulheres.

A histeria é uma palavra originada do grego que significa “hystera”, que significa “útero”. A ideia de histeria tem raízes antigas, com origem na antiguidade que era frequentemente utilizada por Hipócrates na Grécia Antiga, o famoso médico grego que viveu entre 460 e 370 a.C. Hipócrates considerado o “Pai da Medicina” juntamente com seus seguidores, acreditavam que muitas doenças das mulheres eram causadas por um deslocamento do útero que chamavam de “útero errante”. Eles associavam o movimento do útero a sintomas variados como sufocação, convulsões, comportamento irracional, sintomas emocionais, dentre outros.

Para tratar a histeria, Hipócrates recomendava casamentos e relações sexuais regulares. Ele acreditava que a atividade sexual frequente ajudaria a manter o útero no seu devido lugar e, consequentemente, preveniria os sintomas desconcertantes associados à histeria. Além disso, outras práticas incluíam banhos quentes, massagens, e a inalação de vapores aromáticos para acalmar o útero.

Embora a teoria de Hipócrates sobre a histeria tenha sido amplamente aceita por muitos séculos, ela foi posteriormente desafiada e refutada com o avanço da ciência médica. A compreensão moderna da histeria e de outras condições psicológicas e ginecológicas evoluiu significativamente, reconhecendo-se que essas condições têm origens muito mais complexas do que a mobilidade do útero.

A influência de Hipócrates na medicina, no entanto, permanece inegável. Seu enfoque na observação clínica, na ética médica e na busca por explicações naturais para as doenças, em vez de atribuí-las a causas sobrenaturais, estabeleceu fundamentos importantes para a prática médica ocidental. A Antiguidade Clássica, assim, continua sendo um período de grande fascínio e importância, cujas descobertas e ideias ainda ecoam no pensamento contemporâneo.

Histeria na Idade Média e Renascimento:

Na Idade Média a histeria era vista como algo sobrenatural frequentemente associada a questões religiosas. Os tratamentos realizados nesse período eram práticas de exorcismos, jejum, oração e penitências. A condição era tratada menos como uma doença médica e mais como uma aflição espiritual que exigia intervenção divina pois, acreditava-se que os sintomas histéricos se tratava de uma possessão demoníaca e era vista como um desvio moral ou espiritual.

No período do Renascimento, a Europa passou por muitas mudanças culturais, científicas e intelectuais, com isso, esse período é marcado com a tentativa de retornar às práticas seculares e médicas da Antiguidade clássica, em particular às ideias dos antigos gregos e romanos. Médicos e estudiosos começaram a questionar-se sobre as explicações sobrenaturais para doenças e distúrbios mentais, incluindo a histeria. Influenciados por textos redescobertos de Hipócrates e Galeno, os renascentistas procuraram explicações mais naturais e racionais para as doenças.

Contudo, mesmo com esse retorno às práticas mais seculares, a histeria ainda era vista como desvios de comportamento e conduta especialmente em mulheres. Nesse período ainda havia as ideias sobre equilíbrio dos humores e a influência do útero ainda prevaleciam, e tratamentos incluíam métodos como purgações, sangrias e o uso de ervas medicinais. A lenta mudança de perpectiva durante o período do Renascimento contribui para que fosse possível o preparo do terreno para avanços significativos na medicina e na psicologia nos séculos seguintes.

Histeria no Século XVIII:

No século XVIII, a histeria foi atribuída dentro de uma estrutura mais científica, embora as explicações ainda fossem fortemente influenciadas por concepções sexistas da anatomia e psicologia femininas. Nesse período Médicos como Thomas Sydenham (1624-1689), um dos mais influentes clínicos da época, começaram a ver a histeria não mais como uma manifestação exclusivamente ligada ao útero, mas como uma doença nervosa que poderia afetar tanto mulheres quanto homens, embora fosse diagnosticada predominantemente em mulheres. Com isso, os tratamentos para a histeria no século XVIII incluíam uma variedade de métodos, muitos dos quais parecem brutais e ineficazes pelos padrões modernos.

Entre as práticas comuns estavam as sangrias e os purgantes, que visavam equilibrar os “humores” do corpo, um conceito herdado da medicina hipocrática. A ideia era que o excesso ou a falta de certos fluidos corporais poderia causar uma variedade de doenças, incluindo a histeria. Além disso, métodos de choque, como a imersão em água gelada, eram frequentemente recomendados. Acreditava-se que esses tratamentos extremos poderiam “sacudir” o sistema nervoso de volta ao seu estado normal. Embora hoje esses métodos sejam considerados arcaicos e ineficazes, na época refletiam uma tentativa de aplicar intervenções físicas para tratar distúrbios psicológicos e neurológicos.

Histeria no Século XIX:

No século XIX, a histeria foi objeto de grande interesse médico e científico, especialmente na França, onde médicos como Jean-Martin Charcot, um neurologista francês, estudou a histeria com detalhes. Nesse período, Charcot desempenhou um papel crucial no estudo da histeria. Ele trabalhava no famoso hospital Salpêtrière em Paris, observou e documentou numerosos casos de histeria, desenvolvendo métodos de diagnóstico e tratamento que incluíam a hipnose. Na época seus estudos impuseram a histeria como uma condição legitimamente neurológica, sendo considerada diferente de outras doenças psiquiátricas e neurológicas da época. Nessa época Charcot usava a hipnose para tratar os sintomas, demonstrando que os estados hipnóticos poderiam aliviar temporariamente os sintomas histéricos.

Sigmund Freud, que inicialmente estudou com Charcot e mais tarde desenvolveu suas próprias teorias sobre a histeria e outras condições psicológicas, a partir dos estudos e tratamentos de Charcot, Freud se questinou sobre a histeria e o quanto existia uma ligação psíquica, ao invés de uma origem puramente física ou neurológica. Esse momento foi marcado por uma mudança em relação à compreensão e diferenciação entre problemas psiquiátricos, orgânicos e emocionais.

Essa transição do tratamento somático, centrado no corpo e nos aspectos físicos da doença, para uma abordagem psicológica, centrada nos conflitos internos e na mente, marcou uma mudança paradigmática na medicina e psicologia. Por meio das contribuições de Charcot e Freud houve avanços que influenciaram a psicologia moderna e a maneira como se compreende a mente.

Além de Charcot como influência para Freud, temos Josef Breuer seu mentor. Freud e Breuer trabalharam juntos no caso de Anna O., uma paciente que sofria com diversos sintomas histéricos. O tratamento dela, foi baseado na técnica da “catarse” (liberação emocional ao reviver memórias traumáticas), revelou que os sintomas histéricos estavam ligados a experiências emocionais reprimidas.

Além de Freud não se considerar um bom hipnotizador, ele percebe que na hipnose os sintomas voltavam novamente de acordo com o que o paciente passava em seu dia-a-dia e os novos desafios que surgiam. Com isso ele percebe que a histeria possuía raízes inconscientes e que em estado de rebaixamento consciente durante a método cartático, esses traumas viam à tona na fala do paciente durante a hipnose, mas o paciente depois de voltar ao seu estado normal, voltava a não ter noção das questões inconscientes que os afligiam e que geravam os sintomas.

Dessa forma, Freud abandona a hipnose e se dedica à “Associação Livre”, onde os pacientes falavam livremente sobre seus pensamentos, memórias e sonhos. Por meio da fala livre Freud percebe que é possível trazer à consciência esses conflitos, possibilitando que o paciente os resolvesse e, assim, aliviasse seus sintomas. Durante a escuta Freud percebe que na fala surgem questões reprimidas e essas questões geram sintomas físicos e que são manifestas de forma simbólica gerando sintomas. Essa descoberta deu início ao que chamamos de “Formulação de conceitos fundamentais da psicanálise”.

Por meio de todas essas observações, Freud percebe que os sintomas histéricos eram originados da repressão X inconsciente. Com isso ele elabora a ideia de que a repressão é um mecanismo de defesa responsável em bloquear memórias e desejos considerados inaceitáveis, levando eles para o inconsciente. Essas memórias e desejos reprimidos não desaparecem entretanto, influenciam no comportamento e geram sintomas de acordo com o grau de conflito interno que existe na estrutura psíquica.

Histeria no Século XX:

No século XX, o termo “histeria” começou a desaparecer como um diagnóstico oficial, e o termo foi substituído por “Neurose” e outros termos como Transtornos de Ansiedade, Transtornos Dissociativos, dentre outros. No tumultuado cenário do século XX, uma era marcada por guerras devastadoras, revoluções sociais e avanços tecnológicos extraordinários, o conceito de histeria passou por uma metamorfose significativa. Antes uma condição amplamente diagnosticada e frequentemente mal compreendida, a histeria foi gradativamente substituída por terminologias mais precisas e contextualizadas, refletindo uma evolução tanto na compreensão médica quanto na visão social das doenças mentais.

Além do surgimento de novos termos para os transtornos, surge a Psicoterapia Cognitivo-Comportamental e o desenvolvimento de medicamentos psiquiátricos representaram marcos importantes no tratamento de condições anteriormente rotuladas como histeria. A criação dessas novas abordagens terapêuticas oferecem novas formas de lidar com os sintomas mentais.

Além dos avanços médicos e terapêuticos, o século XX também foi marcado por uma reavaliação cultural e feminista da histeria. Autoras como Elaine Showalter destacaram o papel das restrições sociais e culturais impostas às mulheres na manifestação dos sintomas histéricos, ou seja, segundo ela a cobrança, as limitações e as regras impostas às mulheres, são responsáveis pelos sintomas histéricos. Ao longo da história as pressões sociais e até mesmo a negação de autonomia da mulher foi responsável pelo estresse psíquico gerando os sintomas.

Além disso, a autora explorara como a histeria serviu como uma forma de resistência às expectativas sociais opressivas. Para muitas mulheres, a histeria tornou-se uma maneira de expressar angústias não articuladas, uma tentativa desesperada de encontrar uma voz em uma sociedade que as calava. Em vez de serem vistas como meramente doentes mentais, as mulheres que manifestavam sintomas de histeria eram reconhecidas como agentes ativas em uma luta contra as injustiças de gênero.

A reavaliação da histeria por autoras feministas como Elaine Showalter não apenas iluminou as experiências das mulheres ao longo da história, mas também destacou a importância de considerar o contexto social e cultural ao avaliar questões de saúde mental. Essas perspectivas abriram caminho para uma compreensão mais ampla e inclusiva da condição, permitindo que as vozes das mulheres fossem ouvidas e suas lutas reconhecidas em um mundo que muitas vezes as marginalizava.

É interessante compreender que a psicanálise surgiu por meio dos sintomas histéricos, e a partir da histeria e o quanto o psíquico influencia nos sintomas histéricos, foi descoberto que existem outras manifestações de conflitos psíquicos como a Neurose Obsessiva, as Compulsões, Fobias, dentre outros sintomas que podem ser mais mentais e comportamentais ao invés de físicos. Por meio da histeria foi possível compreender a ação do inconsciente e como isso influencia no comportamento do ser humano gerando conflitos diferentes da histeria e que não manisfestam sintomas físicos.

Alguns escritos de Freud que fala sobre a histeria:

Para finalizar sobre o assunto de alguns acontecimentos referentes a histeria, aqui estão alguns dos principais escritos de Freud que abordam a histeria, juntamente com seus anos de publicação:

1. “Estudos sobre a Histeria” (1895) – Escrito em colaboração com Josef Breuer, este trabalho marca o início das teorias psicanalíticas de Freud. Nele, são apresentados estudos de casos clínicos que exploram a relação entre traumas psicológicos e sintomas histéricos.

2. “A Interpretação dos Sonhos” (1900) – Neste livro seminal, Freud discute a interpretação dos sonhos como uma via para compreender os conteúdos reprimidos do inconsciente, incluindo aqueles relacionados à histeria.

3. “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” (1905) – Embora não seja exclusivamente sobre histeria, este trabalho contém discussões importantes sobre a sexualidade infantil e seu papel nas formações psíquicas, incluindo a histeria.

4. “Sobre a Psicopatologia da Vida Cotidiana” (1901) – Neste livro, Freud explora os atos falhos, como lapsos de memória e deslizes verbais, que podem revelar conteúdos inconscientes, incluindo questões relacionadas à histeria.

5. “Conferências Introdutórias sobre Psicanálise” (1916-1917) – Este conjunto de palestras apresenta uma visão geral da psicanálise. Freud aborda brevemente a histeria, explicando sua visão sobre os mecanismos psíquicos.

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